Na noite de hoje, terça-feira, encontramos para o oitavo encontro do Círculo de Leitura e Produção Escrita, na sala do Lappe, das 18h às 19h. Estivemos presentes em sete pessoas para este encontro que encaminha o círculo para o seu final.
A proposta de leitura foi de dois autores de épocas e estilos de textos bastante diferentes: Marcelino Freire e Carlos Drummond de Andrade.
Iniciamos o encontro lendo alguns contos do livro "Rasif", de Marcelino Freire. Contos, em sua maioria curtos, de duas, três páginas, que primam por um trabalho riquíssimo de pontuação. As frases são muito curtas. Entrecortadas. Contos muito pausados, que pedem uma forma de leitura bastante diferente. É preciso lê-los de maneira bastante dinâmica, bastante ritmada, sob o risco de perder a potência sugerida pelos contos. E foi deste modo que fizemos. Cada um lia até um ponto final. E os contos eram compostos por frases realmente curtas, como é possível observar no trecho do conto "Chá": "Piorou. Hã? Piorou. Hum? Pirou, pirou. Xaropou. Não diz coisa. Com coisa. A bolacha. Nada com nada. Coitado! Hã? Coitado! Fulminante. Deu derrame. A bolacha. Passa. Ficou caduquinho".
"Rasif" é um livro muito bonito, esteticamente falando. Edição da record, 2008, de capa dura, e com gravuras muito bem feitas por Manu Maltez (já é possível perceber pela gravura da capa). Não é um livro de se ler só pelas histórias que apresenta. É um livro de se sentir, de tocar e tocar, e correr as mãos por todos os espaços dele.
A explicação do nome do livro vem logo nas primeiras páginas, depois da ficha de catalogação. Diz assim: “recife. s.m. um ou mais rochedos no mar, à flor da água, ou perto da costa. do árabe rasif, terreno pavimentado com lajes, estrada pavimentada com rochedos. pernambuco. s.m. do tupi-guaraniparanã-puca, que significa ‘onde o mar se arrebenta’”.
“Rasif” é um livro de contos com uma linguagem bem trabalhada, cuidadosa, transgressora. São de contos que escancaram a vida em sua forma mais pura e cruel. Assim mesmo, contraditoriamente: purismo e crueldade. Que é a vida. Em “Rasif”, as personagens de Marcelino Freire não querem saber de oferendas falsas a falsos deuses/mitos, não querem saber da paz, “essa coisa de rico, que é bonita na televisão, e só, que causa a dor, e que não deixa”. Elas querem saber dos homens-bomba e de seus amores impossíveis, querem saber do que há de bonito no Afeganistão, em Bagdá, em mesquitas e na “Al-Qaida”. Querem saber dos revólveres em mãos de crianças, e ainda trazidos pelo papai noel. E, como não poderia deixar de ser, as personagens dos contos desse livro buscam o amor, acima de tudo o amor, “amor que pesa uma tonelada. Amor que deixa. Como todo grande amor. A sua marca”. O que não significa que o encontram. Muito pelo contrário. Afinal, o amor também mata. E pode vir mascarado em um buquê de flores.
Após a leitura de alguns contos de "Rasif", lemos um conto do livro "Contos de aprendiz", de Carlos Drummond de Andrade. Um conto intitulado "Flor, telefone, moça", com uma proposta de escrita bastante diferente da presente nos contos de Freire, e muito próxima da presente nos contos que havíamos lido no quinto encontro, do Caio Fernando Abreu, em "Morangos Mofados". Um conto bastante descritivo, com temática também densa, que se utiliza do diálogo da forma como a aprendemos na escola, a forma clássica, com "outra linha, parágrafo, travessão". E também deste livro do Drummond ficou para ser livro o conto "Um escrito nasce e morre", um conto que explora muito bem a metalinguagem na literatura, quando no personagem podemos encontrar o autor do conto se descrevendo através da escrita. Encontramos um personagem que sinaliza o seu nascimento no momento em que começou a escrever, passando pelo seu desenvolvimento, com as atribuições que a escrita impeliu àquele personagem, chegando ao final, o momento em que o personagem “morre”, ou seja, deixa de escrever.
Há, ainda, em "Contos de aprendiz", uma epígrafe muito bonita que apresenta uma relação de um livro - desconhecido para nós - com uma história, com qualquer história que ele leia: "Nas histórias que ele nos contava, quando meninos, o que me prendia a atenção, a ponto de fascinar-me, não era o enredo, o desfecho, a moralidade; e sim um aspecto particular da narrativa, a resposta de uma personagem, o mistério de um incidente, a cor de um chapéu...".
Levei, ainda, um pequeno trecho do livro "A estrada", do norte-americano Cormac McCarthy, apenas para que os participantes tomassem conhecimento do diálogo estabelecido entre pai e filho numa das cenas do romance. Mais sobre este livro pode ser lido aqui, inclusive o diálogo fotocopiado ao grupo.
Ficou, então, como proposta de escrita, a continuidade das anteriores. Construção de contos descritivos e/ou de narrativas curtas, explorando os recursos de diálogos, de pontuação, de ritmos de leitura que todo texto deve propor ao leitor.
Ítalo Puccini, pesquisador mediador.
Fiquei encantado de cara pela capa do 'Rasif', após a bela resenha inda mais... tow sendo comedido, a expressão precisa seria: "puta que pariu que capa maaaaassaaaa!!!" foi o que pensei, de fato rs... queria uma capa assim num livro meu rs... falou dps. que é capa grossa, me ganhou... não sei, dizem que os livros vão ser substituídos, não pela net, mas pelos e-books... se for, vamos ser eternos colecionadores, como o são os dos velhos vinis... :D
ResponderExcluirCara esse livro do Drummond tem um conto q é uma obra-prima incontestável. Trata-se de ”o sorvete”. Mas todos são ótimos mesmo. Abraço e visitarei vc mais vezes
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